
Os conservadores britânicos decidiram um mapa para o Brexit
Partem em 2019, sem concessões ao mercado único e com um registo de trabalhadores estrangeiros.
Os conservadores britânicos tinham duas escolhas em cima da mesa para a sua saída do bloco europeu: uma rutura «leve», que lhes daria um estatuto próximo do da Suíça, ou da Noruega, que têm hoje algum acesso ao mercado comum pelas concessões que fazem na livre circulação de pessoas; ou então uma saída «dura» – o «Hard Brexit» -, rompendo praticamente todos os laços com a União Europeia, especialmente no que diz respeito ao movimento de trabalhadores.
Esta semana escolheram a segunda opção
«Não será um modelo norueguês. Não será um modelo suíço. Será um acordo entre um Reino Unido independente e soberano e a União Europeia», lançou Theresa May à convenção anual do Partido Conservador, na quarta-feira, oferecendo a mais cabal demonstração daquilo a que vinha.
May pode até ter defendido a permanência europeia, mas a vida no pós-referendo é outra.
Como escrevia no Guardian Marina Hyde, Theresa May «evangelizou-se».
Ao seu partido parece ter acontecido o mesmo.
«Eu sei que algumas pessoas perguntam sobre o equilíbrio entre o controlo sobre a imigração e o comércio europeu», disse a primeira-ministra britânica.
«Essa é uma forma errada de ver as coisas. Votámos para sair da União Europeia e tornar-nos um país completamente independente e soberano. Faremos o que fazem os países independentes e soberanos. Decidiremos por nós como controlar a imigração. E seremos livres de aprovar as nossas próprias leis».
A plateia aplaudiu de pé. Aos jornais, conservadores sob anonimato diziam ter recuperado o seu partido das garras do liberalismo social de Cameron.
Ninguém olha para trás no novo Governo conservador
Theresa May anunciou na mesma conferência que o Artigo 50 do Tratado de Lisboa será acionado até ao fim de março, começando o contrarrelógio de dois anos para que o Reino Unido saia da União Europeia.
Contas feitas, a rutura final acontecerá antes do verão de 2019, escassas semanas antes das eleições europeias desse ano.
Quando isso acontecer, promete Theresa May, o país estará unido. «Não há alternativa ao Brexit», disse, numa mensagem dirigida à Escócia, Gales e Irlanda.
‘Medalha da vergonha’
A conferência tory provocou uma reação dura de Angela Merkel, que nos últimos meses vem repetindo a ideia de que o Reino Unido não pode esperar manter o acesso aos mercados se não fizer concessões.
Na quinta-feira, a chanceler alemã disse a um grupo de líderes empresariais reunidos em Berlim que os britânicos não devem receber acordos «confortáveis» na sua saída do bloco.
«Se não insistirmos que o acesso total ao mercado único fique ligado a aceitar as quatro liberdades básicas, então correrá um processo pela Europa no qual a todos tudo será permitido», disse Merkel.
Mas seria o discurso da ministra do Interior, e não o de Theresa May, que faria os títulos da imprensa internacional.
Más notícias para emigrantes
Dentro do plano de Governo para reduzir o impacto da imigração na taxa de emprego entre britânicos, Amber Rudd propõe criar uma legislação que force as empresas britânicas a «serem transparentes» quanto ao número de trabalhadores que empregam nos seus quadros e quanto ao impacto que as suas práticas de contratação podem ter na força de trabalho local.
Ou seja: garantir que não há estrangeiros em postos de trabalho que poderiam ser desempenhados por britânicos.
Mais do que isso, o Governo quer limites à contratação de taxistas estrangeiros, restringir as regras para estudantes de fora do país e ainda propõe que seja um crime senhorios arrendarem conscientemente as suas casas a imigrantes ilegais.
O Governo quer cortar o valor recorde de imigração.
Em março, o número de pessoas que entraram no Reino Unido para trabalhar excedeu em 327 mil o número das que saíram do país.
Mas as propostas de Rudd provocaram quase imediatamente um coro de acusações de racismo. A ministra britânica do Interior recusa-as e coloca-as num saco semelhante ao que Donald Trump, nos Estados Unidos, chama «o mundo do politicamente correto».
«Não podemos ignorar o facto de as pessoas quererem falar sobre imigração; se quero falar sobre imigração, não me chamem racista», disse à BBC. «Devemos ser capazes de conversar sobre imigração, sobre que ferramentas queremos ter no Reino Unido e onde queremos ir com elas para ajudarmos as nossas empresas e economia».
Regresso de Blair?
As explicações de Rudd fizeram pouco para desarmar a surpresa na oposição e na Europa. «Absolutamente chocante», reagiu Karan Bilimoria, célebre empreendedor britânico e independente na Câmara dos Lordes, para quem a proposta do Governo de May não é mais do que um castigo para empresas com uma força de trabalho global. Uma espécie de «medalha da vergonha», segundo Adam Marshall, da Câmara do Comércio.
As queixas multiplicaram-se entre os trabalhistas, os nacionalistas escoceses e as vozes europeístas . «Theresa May dá um tiro no pé», lia-se no editorial do El País; «Xenofobia de mercado», escrevia o El Mundo, dois diários de um país em que hoje vivem perto de 255 mil cidadãos britânicos, pelos dados oficiais – o número real será maior.
A revolta na oposição britânica despertou também uma voz ausente.
Tony Blair revelou à Esquire que está em busca de um lugar na política britânica, que, segundo ele, se confronta agora entre o «Brexit Duro» e a «extrema-esquerda» dos trabalhistas guiados por Corbyn.
«Não sei se há um lugar para mim: há um limite sobre o que quero dizer sobre a minha própria posição neste momento», contou à revista britânica.
«Tudo o que posso dizer é sobre onde a política se encontra. Sinto-o intensamente?
Sim. Sinto-me muito motivado por isso? Sim».
- Com Agências, títulos e sublinhados da redacção
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