
A Floresta da Morte; Portugal Lambe as Feridas.
O incêndio que recentemente atingiu o centro do nosso país, desencadeou uma onda de solidariedade, para com aqueles que foram atingidos pelo terrível acontecimento; e deixou marcas impressionantes de como os portugueses sabem responder à ajuda, quando são chamados para a prestar; aliás, é uma cultura que está enraizada na nossa sociedade e maneira de vivermos.
Em tempo recorde, foram colocados à disposição de quem tinha a missão de a distribuir, comida, bebida e todos os meios de sobrevivência primários, para minimizar as trágicas consequências e efeitos do incêndio devastador já mundialmente conhecido, como o (inferno de Pedrógão Grande).
Mas nem tudo correu bem, como já é do domínio público; onde as palavras dos dois principais responsáveis pelos ministérios da Administração Interna e da Agricultura e florestas, onde ambos dentro do contexto responderam secamente “eu não me demito” quando por um dever de solidariedade para com as vítimas o deveriam ter feito; porque os seus ministérios, foram os principais responsáveis pela não aplicação do bom funcionamento de comunicações SIRESP o primeiro, e a rigorosa exigência no cumprimento das leis da floresta o segundo; por isso, os portugueses gostariam que num rasgo imediato de solidariedade para com as vítimas, os ministros Constança Urbano de Sousa e Luís Capoulas Santos tivessem apresentado a sua demissão; não só não o fizeram, como declinaram qualquer responsabilidade no terrível sinistro que ceifou 64 vidas incluindo a de muitas crianças; que exigem por elas e seus familiares, muita solidariedade e respeito; os ministros em questão não só não se demitiram, como inacreditavelmente tiveram, (a compreensão e apoio) do Primeiro Ministro e Presidente da República.
Gonçalo Ribeiro Telles, foi o paisagista mais influente da cultura florestal portuguesa contemporânea; e alguém o deveria ter escutado quando afirmou, que em Portugal não existe floresta; e que da diversidade de espécies, todos sabemos que o eucalipto é um presente envenenado de acendalhas que com o vento, são lançadas a longa distância; disse numa entrevista no verão de 2005.
A triste atualidade obriga-nos a recuar 12 anos no tempo, para recordarmos Ribeiro Teles que disse, que muito brevemente Portugal seria um Estado sem território.
O alarme foi dado por quem eu considero o maior ecologista português; que considerou trágico não existir uma política agrícola nacional baseada em matas, sebes e compartimentação do espaço.
É urgente fazer um sério reordenamento do território e não tenham ilusões; nós não temos um país florestal, sendo um abuso inqualificável dizer que está a arder uma floresta em Portugal, porque cientificamente ela não existe.
Os portugueses vivem em comunhão com mato, onde a variedade biológica é quase inexistente, e que funciona como um autêntico barril de pólvora; como o que aconteceu recentemente.
Os efeitos devastadores no futuro para a região provocados pela tragédia de Pedrógão Grande, são de tal dimensão que dificilmente os podemos contabilizar; porque aquela é precisamente, a zona mais envelhecida do nosso país, onde a população idosa é representada em número de 300 por cada 100 crianças e jovens no seu conjunto.
Numa situação de desertificação; toda aquela vasta aérea que eu conheço muito bem, será transformada em mato e caça selvagem; ficando à mercê dos grandes empreendimentos, idêntico à exploração dos madeireiros da floresta Amazónica.
Encarar como recorrente, a forma de responsabilizar os proprietários por abandonarem os terrenos; é incúria. desleixo, abandono e incompetência; e é neste contexto que tem que haver responsabilidades, porque 64 pessoas perderam as suas vidas terrivelmente ceifadas pelo fogo; entre elas, encontravam-se muitas crianças.
Muitas das terras, pertencem a proprietários que vieram para a Cidade ou emigraram, perdendo a orientação da sua posse; outros nem sabem que são donos de grandes áreas de mato, sendo aqui a grande falha do Estado; que deve proceder à sua identificação, para que sejam notificados para assumirem a limpeza das suas propriedades; que na eventualidade de não terem posses para o fazer, estas terão que reverter para o Estado; que as terão que limpar com o dinheiro dos contribuintes.
Atualmente através de GPS, é possível reproduzir os limites de uma propriedade com toda a precisão; para tal bastará consultar o Instituto Geográfico e Cadastral, sito na Rua da Artilharia 1 em Lisboa; que informa detalhadamente quais são os limites de uma propriedade.
É certo que os erros começaram no século XIX com plantação do pinheiro bravo, que existia apenas no litoral; e o país, que era um carvalhal compartimentado por culturas, passou a ter uma percentagem excessiva de pinheiro bravo.
Mais tarde, por volta de 1930 assistiu-se à arborização de milhares de hectares de baldios no Gerês, com pinheiros, cedros, faias e carvalhos-americanos entre outras espécies; que acabou por expulsar as comunidades de agropecuária do Norte.
A seguir apareceram os eucaliptos e novamente os pinheiros, para satisfazerem as indústrias de celulose e de madeiras para a construção civil.
Muitas das antigas produções, podiam não ter grande peso na economia; mas contribuíam para a fixação de pessoas no local onde hoje existe um grande déficit de população, com vastas zonas transformadas em autêntico deserto.
Lamentavelmente para quem perdeu a vida, foi invertida a velha regra; e neste caso em concreto os serviços não responderam; foram muitos os chamados em auxílio mas poucos os que valeram, porque não conseguiram salvar as vidas; o inferno de Pedrógão, deu “o mote de partida” para um filme de terror; a Portugal apenas lhe resta lamber as feridas.
- Joaquim Vitorino, Jornalista
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